segunda-feira, 29 de março de 2010

O Inferno de Gordon, parte X: O Tirano da Lua.

O foguete viajava numa velocidade incrível, rasgando o espaço como uma agulha. O Golem, quase uma nave viva acoplado ao sulco no casco do projétil gigante, parecia concentrado em leva-los na direção correta. Lá dentro, Gordon e o Troll estavam sentados desfrutando da turbulência.

- Chacoalha um bocado. - Disse Troll com ar nauseado.

- Pense nisso como um brinquedo de parque de diversões Troll. É divertido! - Gordon queria a todo custo evitar que o gigante viesse a vomitar, seria desastroso.

Troll ficou em silêncio, provavelmente tentando imaginar que havia alguma diversão em ficar balançando numa precária nave no meio do espaço. Gordon se perdeu em seus próprios pensamentos.

- Hey! Onde estão as fadas azuis? - O rapaz se deu conta pela primeira vez de que elas sumiram.

- Não as vejo desde que saímos do meu ginásio. - Disse o Troll.

Gordon coçou o queixo pensativo, mas desistiu, estavam longe demais pra voltar e procura-las, a jornada teria que seguir sem inspiração nenhuma.

A Lua crescia numa das janelas laterais, se aproximando mais e mais, até que a nave pareceu diminuir sua velocidade, estavam pousando.

O foguete desceu verticalmente sobre a superfície desértica da Lua, pousou e ficou ali em pé como estava no laboratório antes de partir. A porta se abriu e desceram os passageiros vestindo trajes espaciais brancos, enquanto Golem se desconectava da nave pra também pousar levemente no chão.

Gordon caminhou levemente naquela gravidade afetada e percebeu que na frente deles, esperando-os, estava um homem. Era alto e forte, muito musculoso, mas com uma aparência amarelada e doente. Sobre os ombros escorria uma capa negra de vinil e na cabeça, uma estranha coroa, que parecia ser feita de carne mumificada. Tinha nove pontas.

- Tire essa roupa idiota. - Disse o homem com grosseria.

Gordon não entendeu bem.

- A gravidade e a falta de oxigênio são ilusões que você criou com essa roupa. Remova-a.

Desconfiado Gordon abriu um dos grampos de seu capacete e ficou surpreso ao perceber que o ar não tentou fugir para o vácuo do espaço. Removeu o capacete e logo toda a roupa de astronauta. Troll fez o mesmo.

- E agora Moon Tyrant? - Gordon perguntou ao homem com a coroa.

- Agora você me segue, vamos conversar. Seus amigos ficam aqui. - Ele disse com olhares de desprezo ao Troll e ao Golem.

Partiram pra longe do foguete e dos dois gigantes. Caminhavam pela paisagem nula da Lua, o imenso deserto cinza e rochoso.

- E começou novamente...tudo de novo. Qual o seu problema moleque? - Moon Tyrant disse mal-humorado.

- Não entendi a pergunta. - Gordon disse visivelmente confuso.

- Você se deixou abalar novamente! O Vortex está em perigo novamente por causa de 47 quilos de carne e um par de olhos castanhos! Porra Gordon! Qual é o seu maldito problema?

- Eu gostava dela, achei que fosse certo. Ela pareceu gostar quando eu disse... - Ele foi interrompido.

- Você disse que gostava dela? Você disse que GOSTAVA dela? Seu cretino! Você não pode dizer esse tipo de coisa! As pessoas não querem que você goste delas Gordon! As pessoas querem ser odiadas, desprezadas, elas querem sofrimento, dor, dúvida! As faz sentirem vivas! Querem ser os vilões de suas pequenas fantasias, pois assim não se sentem vítimas de suas próprias vidas miseráveis! HAHAHA! Vejam só, "gostava dela", é um idiota mesmo! HAHA!

Gordon ficou em silêncio, constrangido ele pensava na verdade contida naquelas palavras duras e debochadas.

- Ela era o fio dourado que não podia ser cortado na teia de Ananasi. - Gordon disse timidamente.

- Eu sei. Essa jornada toda, por causa de uma mulher. Chegar à beira da loucura por isso. Terminou o ciclo.

- Ciclo?

- Nove Rainhas, nove anos de sofrimento. O ciclo das Nove Rainhas terminou. Conte e vai ver.

Mentalmente Gordon se lembrou de nove nomes e nove anos de sofrimento ligados àqueles nomes. Moon Tyrant tinha razão.

- E agora? A jornada terminou?

- Ha! Você bem queria que fosse tão fácil assim não é? - Moon Tyrant riu com amargura. - Não, não terminou. Você está livre das Nove Rainhas, mas não da loucura que elas plantaram em nossa mente. Ainda temos que dar um jeito de não enlouquecer, ou tudo estará perdido.

- Nós?

- Eu vou com você a partir de agora. Nossos amigões ali também. - Apontando pra frente, o tirano mostrava o Golem e o Troll à frente deles, tinham dado uma volta inteira sobre a Lua enquanto conversavam.

- Quem é o próximo? - Gordon perguntou.

- Só falta um, você sabe quem é.

Espantando o pensamento sobre o próximo personagem a ser visitado, o rapaz parou de andar o que chamou a atenção de Moon Tyrant.

- O que foi? - Indagou o Tirano.

- Não era ela. Não era nenhuma delas. Era?

- Sempre a mesma pergunta Gordon... - Tyrant pareceu impaciente. - Não, não era nenhuma delas. As Rainhas só tinham a função de te dar experiência. Do jeito mais difícil, através da dor. Mas agora que o ciclo terminou, estamos livres. Não era nenhuma delas e provavelmente não será a próxima, nem a próxima. Nunca é ela entende? Ambição.

Gordon não respondeu e caminhou na direção do foguete novamente.

- Troll, Golem, vamos indo! Tyrant vai com a gente.

- Nós não vamos mais usar esse foguete, existem meios mais eficientes de viajar. - Moon Tyrant pegou uma lapiseira azul e começou a desenhar um imenso retângulo no chão, depois deu mais detalhes ao desenho e todos viram que era uma porta. Quando ele terminou, a porta brilhou e se ergueu do chão, materializando madeira e metal aos adornos do desenho. Ele girou a maçaneta e a porta se abriu.

Além da porta, pouco se via além de uma luz forte. Moon Tyrant entrou e foi seguido por Gordon, depois Golem e finalmente o Troll, o mais alto de todos eles, que precisou se abaixar muito pra passar. A porta bateu e se fechou, aos poucos, ela se desfez e deixou apenas a superfície lunar na paisagem. Ao fundo, um foguete prateado e o universo, borbulhando de estrelas.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte XI: A Voz da Razão.


[Pra quem não aguenta mais, ta terminando, huahauhauhauha, programei pra terminar no Capítulo XIII, então, logo vcs não tem que aturar mais as minhas brisas incompreensíveis nem minhas lamentações intermináveis XP]

sábado, 13 de março de 2010

O Inferno de Gordon, parte IX: Heavy Metal.

Chovia bastante, mas debaixo das telhas da plataforma na estação de trem, Gordon e Desepero, estavam relativamente protegidos. Já o Troll, estava sentado nos trilhos olhando pros lados distraidamente, ja completamente molhado, mas incapaz de entrar debaixo da cobertura devido o seu tamanho.

Ouviram de longe a corneta anunciando que o trem se aproximava da estação, Troll se levantou e se afastou dos trilhos indo pro outro lado da estação. Gordon e o urso se aproximaram da faixa amarela, uma voz nos megafones da estação disse claramente:

- Não ultrapasse essa porra dessa faixa amarela cacete! Quer morrer por acaso idiota? Quer ficar maneta? É isso? Quer cair na porcaria do trilho e o ser atropelado e virar um maneta de merda? Você é algum tipo de idiota que não gosta dos seus membros? Aí fica de macaquice na plataforma tentando ser multilado por trens?

A voz continuou reclamando e xingando enquanto o trem chegava e diminuia a velocidade aos poucos ao lado da plataforma, isolando o gigante do outro lado. As portas se abriram e Gordon entrou, o vagão estava vazio. Desespero entrou em seguida e se alojou no chão do lado oposto do vagão.

- Venha Troll! - Gordon gritou pela janela.

- Vou correr ao lado do trem, não se preocupe! - Sorriu. - Preciso de exercício!

O rapaz ficou preocupado, afinal o tempo se passava de forma diferente no vortex como ele sempre percebia. Mas lembrou-se também da primeira vez em que encontrou o Troll e ele já passava dos novecentos milhões de flexões. Talvez o gigante realmente fosse apreciar o exercício.

Um sinal sonoro avisou que as portas iam se fechar. O trem lentamente começou a se movimentar sobre os trilhos. Estavam num vagão comum de passageiros, o trem era urbano e as únicas janelas estavam dos lados dos vagões onde se via a paisagem, mas não se via pra onde estava indo.

O trem seguia chacoalhando de leve deixando Gordon calmo e sonolento. Do outro lado, Desespero cochilava respirando alto, as garras arranhando o assoalho emborrachado. A velocidade gradualmente aumentou e logo o trem ia bem rápido com o Troll correndo ao lado, cada passo seu retumbando poderosos como trovões.

Gordon começou a cochilar e tinha lampejos de sonhos. Via garotas, lugares, todos muito familiares. Viu uma linha de metrô. Quando despertou se deu conta de que estava na mesma linha de metrô do sonho, mas aquilo não era agradável, o metrô corria muito e os lugares pra onde estavam indo lhe traziam más lembranças. As luzes do vagão piscavam e Desespero dormia tranquilamente enquanto o vagão ganhava mais e mais velocidade, o gigante já não corria ao lado do trem.

As luzes de repente se apagaram e Gordon teve a certeza de que algo estava errado, o destino que ele queria evitar se aproximava e do outro lado do vagão o urso se levantou com seus olhos negros cheios de maldade.

- Chegou a hora Banks. Só você e eu. Vou devora-lo seu homenzinho patético! - O urso disparou na direção do jovem e atacou com as patas potentes de garras de navalha. Gordon se abaixou e os bancos foram atingidos e destroçados pelo monstro.

- Desespero, pare! - Gordon ordenou, mas o urso riu e ignorou a ordem, novamente atacou e fez o jovem dar um pulo desajeitado pro lado. A pata imensa atingiu o fundo do vagão e estraçalhou a madeira fina deixando um buraco na frente do trem. Gordon olhou de relance e percebeu que aquele único vagão estava sobre os trilhos naquela velocidade sem nenhum maquinista.

Gordon correu pelo lado de urso, que golpeou as janelas e fez chover vidro. Conseguiu chegar do outro lado do vagão o rapaz e olhou pela janela, nem sinal do Troll. Desespero engordou 100kg e atacou novamente, quase nem cabendo mais dentro do vagão apertado de teto baixo. Sua garra destruiu o fundo do vagão e Banks desviou bem a tempo de passar correndo pelo lado da besta novamente.

O trem pareceu diminuir de velocidade, o destino cruel se aproximava, Gordon não queria chegar lá, onde quer que fosse, tanto quanto não queria ser devorado pelo urso imenso.

- Desespero, pare! Te ordeno que pare!

A velocidade diminuiu ainda mais, estavam parando.

- Fique onde está!

O trem finalmente parou.

O urso olhou para Banks com crueldade e avançou, mas jamais alcançou seu alvo.

Um braço imenso, roliço e metálico estourou a lateral do vagão e agarrou o urso pela garganta. A besta foi puxada pra fora pelo buraco, se cortando e se machucando no processo. Gordon olhou pra fora por uma das janelas destruídas pra saber o que acontecia.

Um imenso construto de metal, com mais de 5 metros de altura e aparentando ser uma armadura medieval lutava contra Desespero. Gordon deixou um sorriso invadir seu rosto e disse aliviado enquanto assistia ao combate:

- Golem!

O Golem socava Desespero com punhos duros e impiedosos, o urso grunhia de dor a cada golpe do adversário, que era ainda maior que ele mesmo. Tufos de pelo marrom voavam no ar misturados com sangue. O urso tentou reagir e cravou as presas no ombro da armadura, mas foi ignorado, o Golem não sentia dor. Agarrou Desespero e o atirou no ar, durantes segundos pode-se ver aquele urso imenso rodopiando sem gravidade, quando voltou na direção do chão, foi atingido com mais um poderoso soco que o atirou contra uma coluna de concreto daquela paisagem estranha. O urso desmaiou com o impacto. O Golem virou seu elmo para Gordon, a pequena fresta para os olhos estava vazia, era apenas uma armadura. O titã de metal então agarrou a cabeça do adversário derrotado e antes que o jovem Banks pudesse fazer qualquer protesto, arrancou a cabeça do urso sem esforço, espalhando sangue e pelos pelo chão.

Gordon saiu do trem e caminhou até o Golem:

- Estava imaginando quando você ia aparecer.

Não obteve resposta, o Golem não falava. Gordon olhou então em volta, queria saber onde estava. Era uma velha estação de metrô, mas estava abandonada, concreto e mato por toda parte, as escadas rolantes congeladas no tempo, lotações estacionadas para sempre. Viu uma placa que indicava uma estação da linha vermelha do metrô, mas a placa estava gasta demais pra saber exatamente que lugar era aquele. O rapaz estremeu por dentro, sabia onde estava, só que não queria dizer em voz alta.

- Vamos embora daqui Golem. - Saiu andando na direção pela qual tinha vindo e foi seguido de perto pelo colosso de ferro.

Ao longe ouviram som de trovões. Foram ficando mais próximos, até que finalmente surgiu o Troll correndo como um louco, suado e com ar preocupado.

- O que aconteceu? O trem disparou, não consegui correr tanto.

- Desespero tentou me devorar, mas o Golem me ajudou a tempo.

- Ah Golem, que prazer! - Troll estendeu a mão que ficou no ar sozinha por 4 longos segundos, o Golem apenas olhava pra ele sem reação.

- Ele é a inocência do Vortex Troll, não fala, não pensa, apenas age. Não fique ofendido, ele nunca comprimenta ninguém.

O Troll recolheu a mão magoado e os três se colocaram a andar novamente na direção de onde tinham vindo, deixando a macabra estação de metrô para trás. Seguindo os trilhos, acharam uma bifurcação que levava na direção que deveria ter ido desde o começo.

- Agora esperamos o trem. - Gordon disse sentando-se no chão.

Em poucos minutos viram novamente um trem se aproximar, lhe faltava um vagão. Parou e abriu as portas, Gordon examinou com cuidado e subiu, deixando os gigantes do lado de fora. O trem chacoalhou e se colou na caminho correto da bifurcação. A paisagem foi mudando conforme a viagem prosseguia, cada vez mais prédios e torres de metal, shoppings e hoteis, fábricas, muitas fábricas, logo era claustrofóbico a quantidade de ferro ao redor, era uma cidade imensa, uma metrópole que pulsava como o coração de uma entidade gigante e mecânica, Gordon soube que estava onde precisava estar, sua cidade natal, Santo André.

O trem foi parando finalmente na estação de Santo André e as portas se abriram. O rapaz desceu e olhou o trem partir, viu de longe que um trem de carga se aproximava e viu num dos vagões abertos o Golem e o Troll sentados. Saltaram na estação junto com o jovem e saíram pras ruas caóticas da cidade onde tudo era metálico e brilhava com neons chamativos e, às vezes, sem nexo algum.

- Pra onde estamos indo afinal? - Perguntou o Troll, absolutamente deslocado na cidade, vestindo apenas seu short de treino e com os músculos inchados à mostra.

- Não sei bem, mas imagino que tenha algo a ver com o Golem. - Respondeu Gordon.

O Golem não disse nada e continuou caminhando um pequeno passo a frente dos dois, o que deu a Gordon a segurança de que realmente deviam segui-lo.

Caminharam por toda a cidade, pararam pra comer em todos os restaurantes, viram espetáculos no teatro municipal, visitaram bordéis, dormiram em hotéis, beberam nos bares e se divertiram como nunca. O tempo, que era favorável no Vortex, não passou e gastaram apenas uma noite pra fazer tudo que levariam meses pra fazer no mundo real. Gordon não pode deixar de sentir que aquela era a última refeição de um condenado à morte. Ainda tinha uma missão e uma jornada a cumprir.

Seguiram o Golem então até uma torre negra de metal que sempre viam distante, mas nunca se aproximava não importando em qual lugar da cidade estivessem. Pelas ruas e meios certos, ela passou a ficar mais e mais próxima deles, até que estavam aos pés daquele monumento ridiculamente grande, um prédio. Subiram vários andares e lá dentro o Golem e o Troll não tinham problemas pra passar pelas portas e escadas, tudo era proporcional ao tamanho descomunal dos dois, que faziam Gordon se sentir uma criança o tempo todo.

Chegaram ao último andar e o jovem teve uma sensação de De Javu, aquele laboratório eta familiar, computadores pra todos os lados e no fundo algo enorme coberto com um lençol ainda maior.

- O que é aquilo? - Perguntou o Troll.

- Não sei, mas vamos descobrir. - Gordon foi na direção da coisa e puxou o lençou que saiu dramaticamente de cima daqueli que escondia.

Era uma nave. Parecia um foguete antigo, mas no meio existia um sulco num formato peculiar...no formato do Golem.

- Nós vamos voar nisso Golem? - Gordon perguntou e foi devidamente ignorado pela armadura como sempre.

O Golem começou a escalar a nave e se colou em seu lugar, encaixado no sulco. A nave pareceu ligar e os motores fizeram barulho e soltaram um pouco de fumaça. Na lateral, uma porta grande o bastante para o Troll se abriu.

É isso. Vamos. - Gordon entrou na nave acompanhado pelo irmão gigante.

A nave se fechou. Uma sirene soou alto no laboratório e o teto começou a abrir. Os motores rugiram quando o Golem acelerou e fez a nave decolar finalmente. Subiram verticalmente deixando um rastro de fogo e fumaça no céu.

- Pra onde nós estamos indo Gordon? - Troll perguntou parecendo um pouco enjoado.

- Pra lua!


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte X: O Tirano da Lua.

quarta-feira, 3 de março de 2010

O Inferno de Gordon, parte VIII: O Terceiro Irmão Banks.

Ha quanto tempo caminhavam sem jamais parar pra descansar Gordon já nem se dava mais conta, a jornada presseguia no Vortex, onde o tempo passava de forma diferente. Os dias às vezes podiam durar 30 horas e as noites 16 anos, não se tinha jamais certeza sobre o clima, chuvas de pedra ou de pétalas de flores, assim era aquela terra caótica.

Estavam andando numa região montanhosa, Gordon e Desespero, lado a lado. Eram seguidos de perto pelas fadas azuis que gritavam incoerências em sua linguagem de formiga apenas para ouvirem o eco de suas vozes, que às vezes respondia coisas absolutamente diferentes do que elas haviam dito. Morriam de rir quando isso acontecia.

- Criaturas obtusas. - Resmungou o urso.

- Parece divertido, vamos tentar rabugento. - Gordon foi até a beira do precipício rindo e gritou. - Olá! Tem alguém aí?

O eco respondeu:

- O gosto de sangue na boca lhe agrada!

Desespero estremeceu e fitou Gordon com seriedade:

- Esse lugar é sinistro, vamos embora.

Continuaram caminhando por mais horas sem conta e num planalto acima das montanhas avistaram uma construção. Era grande e espaçosa, cercada de vidro por todos os lados. Gordon achou estranho a princípio, mas finalmente reconheceu o lugar como sendo uma academia.

De perto, o ginásio era ainda mais impressionante, muito alto, e os aparelhos lá dentro pareciam ter um tamanho descomunal. Todas as luzes estavam apagadas e um labirinto de barras de ferro se estendia lá dentro. Não se via nada muito além de dois metros dos vidros.

- Vamos entrar. - Banks sentenciou.

A porta de frente era automática e se abriu quando eles se aproximaram, fechou-se então quando eles passaram por ela. A escuridão opressiva lá dentro só era quebrada pela luz azulada das fadinhas que esvoaçavam ao redor de Gordon deixando tudo com um ar fantasmagórico. Desespero ia logo atrás com dificuldade pra se mover nos corredores estreitos de aparelhos de ginástica.

Tleng! - Ouviram um som ao longe, foram na direção dele.

O labirinto os levou pra dentro do ginásio, mais e mais, de fora o lugar não parecia tão grande assim.

- Novecentos milhões oitocentos e quarenta mil e dois... - Ouviram um sussurro audível. - Novecentos milhões oitocentos e quarenta mil e três... - Tleng! - Novecentos milhões oitocentos e quarenta mil e quatro...

Depois de uma curva fechada Gordon se viu numa clareira no labirinto. Tudo convergia para aquele único lugar onde no centro um homem imenso levantava pesos descomunais que marcavam 100t. cada. No escuro ele prosseguia em seu exercício sem se dar conta dos visitantes.

- Novecentos milhões oitocentos e quarenta mil e cinco... Novecentos milhões oitocentos e quarenta mil e seis...

- Ahn, com licensa? - Gordon falou sem tentar surpreender o atleta épico.

- Hum? - Viram a cabeça do homem se voltar pra eles no escuro. - Minha nossa já é tarde! Já chegaram! Mil perdões!

O homem largou sua barra sobre o suporte que rangeu ameaçadoramente, depois se levantou com agilidade e para Gordon, pareceu que ele nunca terminaria de se levantar, era um gigante de seis, talvez oito metros.

- Eu sabia que estavam vindo, mas perdi a noção do tempo, sabem como é, não vemos o tempo passar quando estamos nos divertindo! - Ele sorria no escuro e tinha uma voz grave e simpática. - Deixem-me acender as luzes.

Ele bateu palmas e as luzes se acenderam finalmente revelando a real aparência do gigante. Era enorme e musculoso, cada parte do corpo inchada e tensa, vestia apenas um short simples e o corpo marombado era coberto de tatuagens aqui e ali, foi quando avistou o rosto do homem que Gordon finalmente o reconheceu. Seus rostos eram idênticos.

- Troll eu presumo.

- Sim, sim! Finalmente irmãozinho! Estava ansioso pra lhe conhecer! - Troll se aproximou e deu em Gordon um abraço de quebrar costelas. - Everton me avisou que você viria, ele me explicou tudo que esta acontecendo.

- E qual a sua história? Quem é você? - Desespero perguntou.

- Quem sou? Eu sou o Troll! O nome correto é Obstinação, mas eu prefiro Lealdade na verdade. Represento nossa capacidade de superar desafios, de jamais desistir!

- E como você pode me ajudar Troll? O que tem pra me ensinar? - Indagou Gordon.

- Não muito eu temo. Acho que basicamente eu devo dizer isso, jamais desista Gordon! Quando as chances forem pequenas, quando tudo parecer perdido, quando você estiver desanimado, quando o mundo todo estiver contra você, nunca desista! Esqueça o significado dessa palavra imunda! Desistir nunca é uma opção! Nem que você precise atingir seu objetivo de um milhão de maneiras diferentes, não se renda nunca! - Ele gritava muito alto e empolgado.

- Saquei. Vamos indo, tenho um Vortex pra salvar. - Gordon disse desinteressado.

- Já vão? Posso ir também?

- Claro, porque não? - Gordon continuou andando pra fora do labirinto.

Mais tarde, caminhando por alguma planície, Desespero se colocou ao lado do jovem.

- Que apatia toda é essa Gordon? Sentindo-se desesperado por acaso? - Riu.

- Só estou cansado, muito cansado de tudo isso. Tudo recai sobre mim e eu tenho dúvidas...

- Quais?

- Acho que a principal é, eu devo mesmo tentar salvar o Vortex?

Desespero se calou com um olhar espantado.

- Não me olhe assim. Vamos andando, o Troll disse que nossa próxima parada é Santo André, vamos ver um velho amigo. Um cara bem durão.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte IX: Heavy Metal.

terça-feira, 2 de março de 2010

O Inferno de Gordon, parte VII: O Sermão da Solidão e da Sabedoria.

Diante dos portões fechados do templo da flor de lótus, Gordon respirou fundo e deu um passo a frente. Os portões se abriram como que por mágica exibindo um imenso pátio de pedras quadradas. Num canto, deitado confortável sobre suas quase 3 toneladas, estava Desespero. A besta olhava o rapaz com seus olhos completamente negros e tinha um ar de riso. Parecia ainda maior do que há pouco quando quase o atacara. O Desespero crescia.

- Eu não tenho pressa. - Caçoou.

Gordon ignorou e continou andando até a porta de acesso. Entrou no templo pra descobrir uma construção de uma simplicidade incrível. O teto era muito alto, mas quase não haviam adornos em parte alguma, com excessão das vidraças coloridas que representavam grandes mandalas redondas. Bancos de madeira estavam dispostos ao longo das paredes e um altar pequeno estava no fundo do salão, repleto de fumaça azulada de incensos acesos. No centro, ambos sentados em posição de meditação, estavam o Cavaleiro e Beggar.

- Junte-se a nós Convicto. Por favor. - Disse o Cavaleiro em tom sereno.

Convicção se aproximou e não pode deixar de reparar que Solidão estava agora despido de sua camisa, a ferida enorme em seu peito pulsava infecciosa e uma grande quantidade de sangue escorria do ferimento o tempo todo, o colo do Cavaleiro estava encharcado de sangue escuro e fétido.

- Antes de tudo. - Disse Beggar. - Saiba que minha parte nessa jornada termina aqui Convicto. Eu vou permanecer no templo quando você se for. Sabedoria te guiou até aqui da melhor maneira que pode, mas depois do que você aprender aqui, só vai poder enfrentar a insanidade apoiado em outras coisas. As Princesas da Inspiração ainda se afeiçoam de você eu percebo, e o crescente Desespero que está do lado de fora também vai, de certo, querer acompanha-lo.

- Entendo. - Disse Gordon apático.

- Sente-se. - Solidão fez um gesto com a mão que apontava um lugar no chão a frente deles. Sentado ali, Gordon e os dois monges formariam um triângulo perfeito.

O jovem se sentou sem discutir. Olhou para Beggar e depois para o Cavaleiro, seu olhar era de desanimo e frustração.

- Sabedoria. - Iniciou o Cavaleiro.

- Solidão. - Continuou o monge-mendigo. - Tão distantes e ainda assim, tão próximos.

O altar soltou um chiado e a fumaça dos incensos subiu no ar com intensidade. Todo o ambiente se encheu com aquele cheiro doce e esotérico. Gordon sentiu suas pálpebras ficarem pesadas.

- Do que um dia foi Amor e hoje é Solidão... - Disse Beggar. - ...temos lições valiosas a aprender. De comedimento, auto-controle, desapego.

- Isso é claro Gordon... - Disse o Cavaleiro. - ...se você estiver disposto a aprende-las.

A fumaça do altar mais uma vez se lançou magicamente no ar, os olhos de Gordon ficaram mais pesados e no seu torpor semi-hipnótico, ele deixou um pequeno sorriso lhe dominar a face quando disse:

- Claro, me ensinem o que puderem.

- Feche os olhos e medite Gordon. - Disseram os monges em uníssono.

E quando Gordon fechou seus olhos e respirou mais uma vez aquela fumaça densa, o mundo a sua volta se transformou.

Ele caiu no espaço por longos segundos, desorientado e espantado. Então viu a seu lado Beggar e o Cavaleiro, que também caíam, mas estavam de pé e tranquilos. O Convicto tentou se ajeitar, mas foi tarde, bateu em algo.

A príncípio ele não entendeu o que era, sentia-se envolvido dos pés a cabeça, era difícil respirar. Mas então seu tato aos poucos reconheceu onde se encontrava. Estava de alguma forma envolvido numa cascata de cabelos longos e grossos. A sensação, embora alienígena, era muito agradável e Gordon se pegou tentando tragar aquele perfume delicioso.

- Da vontade de ficar aqui pra sempre não é? - Perguntou o Cavaleiro acima da "margem" do rio de cabelos perfumados.

- O que é isso? - Gordon flutuava em meio as madeixas, somente com a cabeça de fora. - Onde estou? De quem são esses cabelos?

- Não se acostume com esse toque Convicção. - Disse Beggar, que surgiu ao lado do Cavaleiro. - Embora confortável, a vida é impermanente, inconstante. Você tem que sair daí.

- Mas eu não quero, é realmente muito bom! Vocês deviam entrar aqui! - Gordon se segurou aos cabelos sem nem mesmo perceber.

- Temo que não Gordon. Você deve deixa-los soltos. Vamos, saia daí. - Disse o Cavaleiro estendendo a mão.

- Não! Não vou sair daqui! É tão... confortável e aconchegante. - Os cabelos que Convicção apertava estavam agora enrolando-se em seus braços e pernas, uma mexa se enrolou perigosamente em seu pescoço.

- O conforto que eles oferecem é vão Gordon. - Disse Beggar.

- E o preço que cobram, alto. - Terminou Solidão.

- Livre-se dessa ilusão! - Disseram juntos.

- Não...não quero...não...me deixem em paz. - Gordon estava sonolento, os cabelos agora o apertavam com força deixando marcas roxas em seu corpo. Ele finalmente começou a sentir dor. - Hey, que está acontecendo? Me solte!

- Se livre da ilusão Gordon. - Insistiu Beggar com firmeza.

Concentrando-se na maciez daqueles cabelos e naquele perfume enebriante, o Convicto colocou-se a pensar em como aquilo o prendia a sentimentos ruins. Afinal, era confortável estar ali, mas o sentimento da perda era insuportável. Grilhões.

Os cabelos se transformaram em correntes imediatamente, enferrujadas e fedorentas. Gordon escalou sua saída até os dois mentores que o aguardavam.

- Muito bem. - Disse Solidão. - Acabou de aprender talvez a lição mais valiosa que nós poderíamos te ensinar.

- Livre-se da ilusão Convicto. Não existe controle. Não existe controle sobre nada. - Disse Beggar. - Você deve se concentrar nos acontecimentos que a vida lhe entrega, não nas coisas que você agarra com unhas e dentes, não nas ilusões que você estrangula com seu desejo!

Gordon entristeceu-se, abaixou a cabeça. - Eu entendo.

Como se acordasse, as luzes se acenderam, estavam os três de volta no templo sentados no chão, o ar cheio de fumaça azulada e doce.

Solidão tinha no rosto a mesma expressão triste de Gordon, seus olhos estavam inflamados e parecia que o Cavaleiro ia chorar a qualquer instante. Beggar tinha o semblante sereno de sempre, austero e estóico.

Uma fadinha azul pousou no ombro de Gordon, ele pareceu voltar à realidade.

- Era só isso o que tinham pra me mostrar?

Solidão ficou em silêncio, Beggar se levantou:

- Tínhamos muito mais pra mostrar Convicto, mas eu acredito que você entendeu tudo com a primeira demonstração. A lição mais importante é o desapego. Não se entregue a sentimentos que você nem mesmo tem certeza de que estão lá, isso vai feri-lo mais do que qualquer coisa.

- Livrar-me da ilusão do controle. Vou meditar a respeito. Quem é o próximo?

Gordon saiu do templo seguidos pela costumeira revoada de fadinhas azuis, Desespero estava preparado para partir.

- Já posso te devorar agora?

- Cala a boca seu gordo idiota...

- Boca grande pra alguém que está pra ficar louquinho da silva. Pra onde vamos?

- Ver meu irmão.

- Nós já vimos Everton.

- Meu OUTRO irmão.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte VIII: O Terceiro Irmão Banks.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Inferno de Gordon, parte VI: O Templo da Flor de Lótus.

Do alto da última montanha de gelo, avistaram no vale abaixo um templo imenso. Observaram estóicos o monge, o rapaz e o urso, cercados por uma nuvem azulada de fadinhas animadas com o tempo um pouco mais ameno fora da geleira.

- Sabe quem vive ali? - Gordon perguntou ao mendigo casualmente.

- Sim.

- E quem seria?

Beggar sorriu.

- Eu.

Desceram pela encosta da montanha e finalmente pisaram numa grama azul e macia, poucas árvores magras estavam entre eles e o templo. Caminharam por alguns minutos, até chegarem na entrada principal do templo, onde eram aguardados por uma figura alta de pele queimada e olhos de águia.

- Solidão! - Gordon disse com ar surpreso.

O Cavaleiro Solitário vestia vestes simples de monge, como as de Beggar. Era ainda magro e musculoso, mas seus longos cabelos haviam sido raspados e pela abertura da camisa, podia-se ver no peito dele uma ferida horrível que ainda estava aberta e infeccionada.

- Bem vindo Convicto, e vocês também Sabedoria, Desespero, Princesas da Inspiração. - Sua fala já não tinha traço algum de sua antiga arrogância, ele parecia sereno e calmo, quase sereno demais, anestesiado.

- Você disse que essa era sua casa Beggar, que significa isso? - Gordon voltou-se sério para o monge-mendigo.

- Razão ordenou que Sabedoria guiasse sempre o Amor. - Gordon estremeceu à mera lembrança de que um dia o Cavaleiro tivesse sido o Amor do Vortex, e que hoje fosse apenas Solidão. - Eu acolhi o pobre bastardo em minha morada para que ele aprendesse de mim, que se recompusesse e quem sabe um dia...

- Basta! Não quero ouvir! - Gordon interrompeu furioso.

Afastado da discussão, Desespero engordou quase 100kg, aumentaram suas presas e garras, a besta rosnou satisfeita.

- Acalme-se Convicto. - Beggar tentou.

- Não! Não há nada que eu possa aprender da Solidão! Ainda acorrentado naquele templo, ainda chamado Amor, talvez você pudesse me ensinar algo que nos ajudasse nessa hora, mas sendo quem você é agora seria uma perda de tempo parar aqui e conversar com você! - Gordon estava aos berros, o rosto vermelho, os olhos inflamados e negros.

- Gordon, por favor. - Disse o Cavaleiro.

- Não!! Já disse que não quero ouvir!! - Gordon se precipitou e enfiou um soco no rosto de Solidão, ele cambaleou para trás e caiu sentado no chão.

Desespero, com uma agilidade desproporcional ao seu corpo imenso, levantou-se e se colocou ao lado de Gordon rosnando para ele, no processo, engordou 300kg, estava enorme agora, mesmo sobre as quatro patas tinha quase dois metros e meio de altura.

- Tão cedo Convicção? Achei que você fosse durar mais fedelho! - Disse a besta.

- Gordon, acalme-se! Controle-se! Acredite que algo de bom pode sair dessa situação! - Beggar implorou.

Gordon fitou o urso com ódio, depois seu ódio foi ainda maior quando encarou Solidão, então finalmente viu Beggar e ao redor dele as fadinhas azuis que riam e brincavam alheias à situação tensa que se desenrolava. Rendeu-se e sorriu ao ve-las.

- Preciso de tempo pra me acalmar.

- O tempo que precisar Convicto. - Disse Beggar. - Afaste-se Desespero! Vamos para dentro do templo. Você também Solidão.

O rapaz caminhou pra longe da entrada do templo, os portões de madeira foram ficando menores a medida que ele subia uma colina onde soprava uma brisa gelada e inquietante. Olhou ao redor, colinas e mais colinas daquela grama azulada e fofa, um oceano de colinas azuis. Sentou-se.

Sentiu um puxão no cabelo e percebeu que tinha sido seguido pelo batalhão de fadas azuis, elas estavam se estapeando pelos melhores lugares em seus ombros. Finalmente sentaram-se todas.

- Beggar está pedindo demais de mim dessa vez. Dar ouvidos àquele traidor, àquela coisa maldita.

Uma voz tranquila veio de algum lugar atrás de Gordon:

- O destino do Vortex depende de seu aprendizado nessa jornada, você sabe disso.

- Mas o que Solidão poderia me ensinar?! É absurdo achar que ele tem qualquer informação que seja. - Gordon retrucou sem olhar para trás.

- Você reage assim porque Solidão é a criatura que você mais teme Convicto.

- Eu não o temo!

- Teme sim. E não poderia ter ficado mais claro pela maneira como você se comportou lá embaixo. Desespero está se fortalecendo da sua fraqueza.

Gordon não disse nada por um tempo, ficou brincando de cabo de guerra com as fadinhas e um pedaço de grama alta.

- Precisamos que você aprenda a tirar força das dificuldades que enfrentar Convicto. De você depende o Vortex e a existência de todos nós. Lembre-se de Ananasi e Slayer, lembre-se de Tornado e Everton, aprenda a usar as armas que eles lhe deram, selecione o que você quer fazer, analise como usar isso e então entre em ação!

- É tão difícil...e eu estou sozinho, tudo recai sobre mim...como posso saber que estou no caminho certo? Às vezes eu penso em só me sentar aqui e não fazer nada, deixar a maldita loucura tomar conta de tudo. Seria tão mais fácil.

- Você realmente acredita nisso Convicção? Porque se acreditar, estamos todos condenados. Se você realmente acredita que não fazer nada é a melhor solução, nem se dê o trabalho de levantar, porque antes que você perceba, a Serpente Emplumada vai dominar tudo o que existe de importante aqui para nós.

- O que é essa Serpente afinal? Slayer falou dela.

- Acredite que você pode fazer a coisa certa Convicto, salve o Vortex e a todos nós e aí talvez, você jamais precise saber o que é a Serpente.

- Só gostaria de ter todos os detalhes.

- ...

- Você já foi embora não é?

Gordon se virou para ver a colina vazia como estivera o tempo todo, suspirou.

- Vamos meninas. - Disse levantando-se. - Nós temos que ter uma conversa com aquele cara lá embaixo.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte VII: O Sermão da Solidão e da Sabedoria.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

O Dilema de Ezerhorden

Ezerhorden escutava com atenção tudo que a criaturinha a seu lado dizia, o pequeno Goblin o cativava.

- Me mate. É o único jeito de não deixar as pessoas más descobrirem onde fica o reino secreto do Rei-Dragão.

- Você está louco? Não vou mata-lo a troco de nada!

- Mas é o único jeito, o Rei-Dragão tem que ser avisado! O reino dos mortos é o meio mais rápido!

- Reino dos mortos? Espere aí...o Rei-Dragão é, Samma? Como em Samma, o Deus da Morte?

- Sim!

- Por essa eu não esperava.

Ezerhorden parou pra pensar. Admirou o pequeno Goblin por ser tão leal a seu senhor, afinal, para um servo do deus da morte, nada mais nobre do que morrer e finalmente se unir a seu mestre no outro mundo. Aquela missão não era sua. Resolver finalmente dar um passo atrás.

- Feche os olhos pequenino.

Goblin fechou seus grandes olhos amarelos pela última vez. As mãos enormes de Ezerhorden torceram seu pescoço matando-o imediatamente.

O gigante cavou uma sepultura para a criaturinha. Plantou mudas de hibiscos brancos e azaléas sobre o pequeno túmulo, voltaria ali ainda um dia para visitar o pequeno e valente servo de Samma.

Minutos depois de enterrar Goblin, fez uma prece.

- Grande Samma, deus do omega, do fim, da morte. Hoje eu espero não te-lo ofendido ao lhe enviar seu servo antes do tempo. Mas terá mesmo sido antes do tempo? Enfim, o pequeno Goblin foi leal e corajoso e eu espero que Vossa Divindade tenha aí em seu reino um lugar reservado a um servo como ele. Ele leva consigo uma mensagem que parece ser importante que chegue até você.

A oração foi interrompida.

*****

Naquela noite, longe de todos no acampamento, Ezerhorden foi até uma clareira na mata, lá ele se entregou aos espíritos e sua forma mudou. Seu corpo foi coberto de pelos negros, suas pernas se curvaram e cascos brotaram de suas botas, um par de chifres negros enfeitou uma cabeça de bode no alto do pescoço agora muito mais musculoso.

- Espíritos me ouçam! Preciso de um favor!

Apareceu na clareira a forma conhecida de Ascor, o shifter que fora um dia o mestre de seu mestre.

- Diga jovem Ezerhorden, o que os espíritos podem fazer por você esta noite?

- Mestre, mandei para as profundezas da morte hoje um ser chamado Goblin, gostaria que vocês o guiassem em segurança até o mundo dos mortos. Peço proteção pelo pequeno.

- Posso saber o porque?

- Culpa. Me sinto mal por te-lo matado, mas senti que era o certo a se fazer na hora. Ele leva uma mensagem importante ao rei dos mortos.

- Ele será protegido então, fique seguro.

O gigante voltou para dormir ao lado de seus companheiros de aventura.

[Trechos de uma aventura de RPG jogada por mim com meu personagem Ezerhorden.]

sábado, 13 de fevereiro de 2010

O Inferno de Gordon, parte V: Nanook, the Dark Hunter of Lust.

Caminhavam os heróis numa tundra gelada e desértica, Gordon na frente, Beggar à direita e Desespero à esquerda. As fadinhas estavam todas pousadas nos pelos grossos do urso pardo, enroladas e confortáveis, a salvo do frio, rindo e cantando.

O deserto gelado se extendia por quilômetros, plano, hostil, estéril. Nada se via além de um branco puríssimo e cegante. Os viajantes cobriam os olhos semi-cerrados e andavam contra o vento cortante, a sensação era de um frio extremo, mesmo assim, Beggar não vestia nada além de seus trapos de costume. Gordon estava agasalhado com roupas pesadas que comprou no vilarejo.

Caminharam no que eles achavam, quase com certeza, que era uma linha reta durante horas. Não viram nada além do céu azul claro se chocando com o chão branco e congelado.

- Tem certeza de que você sabe pra onde está indo? - Beggar perguntou alteando a voz pra ser ouvido acima do barulho do vento.

- Eu tenho que acreditar que sei! - Gordon gargalhou aquela risada grave e curta. - Toda a existência aqui no Vortex se sustenta sobre esse tipo de coisa, não? Você sendo sábio, Razão sendo lógico, o Golem sendo inocente e eu...acreditando!

Beggar apenas sorriu e balançou a cabeça, continuou seguindo Convicção.

Eles finalmente avistaram, depois do que pareceram mais de 18 horas de caminhada, um vulto negro muito pequeno no horizonte, parecia um homem. Seguiram naquela direção. Ao se aproximarem, constataram que era realmente um homem, estava vestido com um traje de esquimó, feito de um couro azulado e grosso. Estava com a cabeça coberta por seu capuz e no rosto usava uma máscara de madeira em forma de óculos, a pele do rosto era muito branca. O homem era alto, quase anormalmente e segurava uma lança longa e de aparência poderosa. Ele estava guardando um buraco de um metro no gelo, a um metro de profundidade a água escura e gelada estava calma.

- Olá. - Gordon começou, mas foi bruscamente interrompido pela voz seca e rouca do esquimó.

- Silêncio!

Um silêncio desconfortável se estendeu por alguns segundos.

- Eu sou Nanook. - O caçador sussurrou. - Nã - Nuk. O Caçador Sombrio da Luxúria. Silêncio!

Um vulto escuro se mexeu na água, Nanook precipitou sua lança que atingiu carne gorda e macia, o sangue esguichou e ele puxou sua presa pra fora d'água. Dando gritos orgasmáticos, uma criatura se debatia na ponta da lança, era grande e lembrava uma foca, mas tinha uma cabeleira espessa e ruiva na cabeça, seios imensos e flácidos, tinha cor de pele humana clara, não era um animal comum. O caçador sorriu com perversão enquanto sacava uma faca de caça do cinto, dirigiu a lâmina até a garganta da presa e sem hesitar cortou-lhe o pescoço que jorrou sangue. Gordon e os outros apenas assistiam ao espetáculo bizarro sentindo-se confusos e impotentes.

- Mais uma. - Riu rouco o esquimó.

- O que era isso? - Gordon perguntou com genuína curiosidade.

- O que era? Uma mulher oras! Estou caçando essa aqui há dias, finalmente a fodi! - gargalhou alto e sua voz rasgada incomodou os tímpanos de todos.

Gordon fitou Beggar em busca de conselho, mas o monge-mendigo parecia tão confuso quanto ele.

- Bom, você sabe o que está acontecendo? A espiral de loucura na qual o vortex está se transformando e como eu devo impedir que isso ocorra?

Nanook agora estava abaixado perto da carcaça, ele fazia pequenos cortes descomprometidos na carne.

- Ouvi boatos, todos ouvimos. Honestamente? Não me importo.

- Não se importa?

- Não. Vivo aqui sozinho desde muito tempo atrás, nesse deserto branco. Nunca me deixaram sair, não de maneira apropriada pelo menos. Sou um prisioneiro aqui Convicto. - Ele se levantou e olho pro horizonte. - Ah, as coisas que eu poderia fazer se me deixassem sair daqui. Você ia viver a vida Gordon, finalmente ia viver a vida.

- A julgar pelo que acabei de ver, não sei se quero o que você oferece.

Nanook olhou para a carcaça, de súbito correu pra sua lança, se voltou pro buraco e investiu contra a água. Uma criatura semelhante à primeira, mas dessa vez de cabelos loiros e seios pequeninos se debateu na ponta da arma. O esquimó riu alto.

- Aqui está mais uma Gordon! Você a quer? Quer fode-la? Eu posso fazer acontecer!

Gordon dirigiu um olhar de nojo ao caçador e permaneceu em silêncio.

- Bah! - Nanook sacou sua faca novamente e enfiou-a nas tripas do animal que se debateu de dor, deu-lhe uma facada no peito e outra então no pescoço, logo a criatura parou de se mexer. - O poder que eu poderia lhe dar Gordon, as mulheres que conquistaríamos juntos! Se ao menos você reconhecesse o seu potencial, mas não, insiste em se rebaixar, se fazer inferior!

Imperceptívelmente, Desespero engordou 40 quilos, suas presas ficaram ligeiramente maiores e ele rosnou baixinho satisfeito.

- Não é isso que eu quero Nanook. Caçar mulheres como se caça comida, é nojento.

- Você interpreta muito bem esse papel, mas acredita mesmo nisso Convicto? Nunca lhe passou pela cabeça como seria? Só se entregar à Luxuria sem pensar em mais nada? Sem culpa, sem existencialismo, sem pensamentos profundos? - Aos pés do esquimó, em pleno gelo, brotou um pequeno ramo verde.

Gordon ficou em silêncio ouvindo seus próprios pensamentos. Beggar o observava com preocupação. Desespero estava deitado no gelo com ar satisfeito e as fadinhas ainda estavam enroladas nos pelos grossos do urso.

- Eu quis isso. - Gordon cedeu. - Eu quis isso por muito tempo Nanook. Ser como todos os outros. Ser fútil, vaidoso, vão. - O ramo verde deu um broto roxo. - Queria não temer meus sentimentos, nem mesmo senti-los! Queria ser só mais uma casca sem conteúdo algum, viver pra beber, fumar e foder! - O broto se abriu numa linda flor. - Mas eu não quero mais isso. Eu pude perceber o quão infelizes são essas pessoas. Com medo de tudo, sem saber pra onde ir, sem saber o que fazer além de beber, fumar e foder. Hoje não existe mais esse desejo em mim Nanook, de ter mil mulheres. Eu quero algo real caçador, algo no que acreditar e não somente mais uma presa. Você não tem nada pra me oferecer, vai continuar preso nesse deserto branco, estéril e PURO.

A flor roxa aos pés do esquimó enegreceu e murchou, caiu no solo gelado destruída.

- Entendo. - Disse Nanook. - Mas eu não cessarei de existir, vão existir outras oportunidades pra me libertar. Se a loucura não se instalar no Vortex, alguma outra coisa eventualmente vai. E então eu vou caminhar livremente Convicto.

- Como saio daqui? Quem é o próximo?

- Siga naquela direção. - Nanook apontou o Leste. - Vão saber quem é o próximo quando deixarem as geleiras.

Gordon não se despediu, apenas começou a andar na direção sugerida. Beggar fez uma ligeira reverância e se retirou e atrás deles foi Desespero, um pouco mais gordo, um pouco mais forte e um pouco mais faminto.

Nanook os observou se afastar durante vários minutos, até virarem pontos negros no horizonte. Voltou-se pro buraco de água escura, algo se mexeu lá embaixo. Ele largou a lança no chão.

- Foda-se. Broxei.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte VI: O Templo da Flor de Lótus.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

O Inferno de Gordon, parte IV: Everton, pois seu pior inimigo é sempre você.

O mar urrava furioso e jogava o pequeno barquinho de um lado pra outro sem piedade em ondas de 15 metros de altura. Lá dentro da pequena cabine da embarcação, Gordon, Beggar e Desespero se seguravam como podiam nos móveis e paredes. Uma poltrona solta ia e vinha atingindo os joelhos deles várias vezes, as fadinhas riam cada vez que isso acontecia, empoleiradas numa prateleira vazia.

- Odeio o mar! - Gordon gritou por sobre o barulho da tempestade.

- Eu também posso pensar em alguns lugares melhores pra estar agora. - Desespero admitiu.

Beggar apenas guardou silêncio e deu um sorrisinho com o canto da boca.

A tempestade começara assim que a terra sumiu de vista no horizonte e durava cerca de dez ou onze horas. Estavam todos exaustos, mas não parecia que aquilo ia durar muito mais.

- Slayer disse que ele nos encontraria! - Beggar repetia a cada meia hora, o barulho das ondas encobrindo partes da sua frase.

Logo escureceu e a tempestade, mesmo sem aumentar de intensidade, parecia ainda mais sinistra. Os raios iluminavam a superfície do mar e mais de uma vez Gordon jurou ver sombras imensas debaixo da água, leviatãs marinhos prontos pra atacar. Mas nunca atacaram.

Na alta madrugada o mar pareceu finalmente se cansar, embora ainda chovesse forte, mas o vento diminuiu e o barco estava mais estável. Gordon saiu da cabine pra tentar ver alguma coisa, no horizonte ele avistou uma luz que reconheceu como sendo uma outra embarcação.

O segundo barco era um pouco maior do que o barco onde estavam, tinha uma aparência mais segura e "experiente". Conforme se aproximou dava pra ver uma pintura azul pálida e as letras grandes na lateral que indicavam o nome da nau, "The Merrow". Na proa estava o homem que Gordon menos queria ver ali, seu gêmeo identico, Everton. Ele jogou uma corda grossa sobre o convés.

- Subam! - Ordenou.

Após a difícil tarefa de transferir um urso do tamanho de Desespero de um barco ao outro, estavam todos bem, o anfitrião guiou-os pro interior, uma cabine escura e solitária onde na porta lia-se "Captain Troll".

Everton, embora identico a Gordon, tinha alguns traços bem interessantes pra distingui-los. O capitão do Merrow não tinha a perna direita, que era substituída por uma perna tosca de madeira escura. Seu rosto era deformado por uma cicatriz larga que cruzava por cima do seu olho direito, branco e cego. E finalmente a mão direita só tinha três dedos, faltando o anelar e o mindinho.

- Essa jornada é inútil! - Ele bradou enquanto pegava copos e garrafas num armário. - Você é fraco demais pra conseguir. - Concluiu o capitão.

- Agradeço o voto de confiança cara. - Gordon disse cínico.

- Calado. - Ele serviu bebidas a todos e mancou até uma poltrona na qual se jogou desajeitado. - Eu falo, você escuta, pega tudo que eu disse e faz o que quiser com isso. É assim que tem funcionado não? Você ouve um sermão de cada um de nós e no final vai ter que se virar pra evitar o fim. Evitar o inevitável. - Ele fungou pelo nariz.

Gordon ficou em silêncio, visivelmente contrariado.

- Vocês me chama de Egoísmo. - Everton começou. - Justo. Vamos falar do quanto somos egoístas então.

Ele deu um gole em sua bebida e todos repetiram o gesto, pra surpresa de todos, era apenas suco de guaraná.

- Você é o unico que pode se salvar Gordon. E você também é o único que pode se condenar. Salve-se e vai salvar a todos, desista e estamos todos fodidos.

- Vou precisar de mais que isso. Como eu posso superar minhas limitações e fazer o que é preciso pra alcançar nossos objetivos?

Caiu um silêncio sobre o cômodo, quebrado apenas pelas fadinhas voando pra todos os lados e brincando entre si, falando naquela língua estranha e ininteligível delas.

- Não sei o que responder.

Beggar se levantou.

- Então estamos perdendo tempo aqui. Vamos em frente.

- Sente-se velho! Eu tenho uma coisa ou outra pra dizer...só não sei responder essa pergunta, não da maneira como ele perguntou. Acho que superar suas limitações e fazer o que é preciso não é uma fórmula mágica. Você terá que tratar cada caso como único.

- Entendo. - Gordon disse enquanto Beggar se sentava ofendido.

- Você basicamente já conseguiu as suas duas maiores armas nessa jornada, medo e coragem vão te levar longe. Agora, acho que egoísmo vai ser uma coisa útil na hora de balancear quando usar o medo e quando usar a coragem, entende? Eu sei muito bem dos nossos defeitos, falar demais, sem pensar, apaixonadamente demais. Nessas horas, você terá de aprender a se refrear e usar o medo pra fazer uma barricada sentimental na sua verborragia. E quando você estiver inseguro, em dúvida, sem esperanças, terá de usar a coragem como combustível pra seguir em frente. Como eu disse, o único que pode te impedir de conquistar o que quer que seja, é você mesmo. Seja por ser audacioso ou por ser medroso demais. Ser egoísta na medida certa vai te ajudar a medir as consequências dos seus atos, e principalmente, das suas palavras.

- Nós falamos demais, saquei. - Gordon dissem em tom entediado.

- Sim falamos. - Everton repetiu severo. - Você principalmente Convicto! Meu conselho extra-oficial é, aprenda a manter a maldita boca fechada seu imbecil!

Desespero riu baixo e Beggar fez um olhar reprovador, Gordon gargalhou alto.

- Esse foi o melhor conselho que me deram até agora sabe? Mas a merda está feita, palavras são como flechas meu bom irmão, temos que nos focar em resolver o problema atual.

Continuaram a conversa de maneira mais informal a partir dali, Beggar ficou impressionado, jamais vira os gêmeos conversando de maneira tão civilizada antes. Atacaram-se muito pouco até que começaram a ouvir aves marinhas, estavam perto da terra.

Desceram do barco num porto gelado de uma cidadezinha costeira, as montanhas ao redor estavam cobertas de gelo, eles rumaram diretamente pra elas pra encontrarem o próximo personagem da jornada. Gordon estava tendo um sentimento estranho no estômago, a partir dali, daquela conversa com o homem que mais odiava em todo mundo, ele mesmo, pegou-se pensando que tudo estava agora sobre uma balança e que cada ação ia empurra-la numa direção ou em outra. Sanidade e insanidade eram uma questão de saber controlar-se da maneira apropriada agora.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte V: Nanook, the Dark Hunter of Lust.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O Inferno de Gordon, parte III: Slayer, Plebeu-Medo.

Londres era só neblina e garoa fina naquela manhã. Na entrada da cidade estavam estacadas 3 figuras imponentes. Um jovem alto e gordo de olhar feroz, Gordon. Um velho careca de ar cansado e sábio, Beggar. Um imenso urso pardo de olhos muito negros e vazios, Desespero. Ao redor deles um enxame de luzes azuis circulava alegremente, fadinhas de 2cm de altura e asinhas de formiga.

- E então? - Gordon perguntou pra ninguém em particular.

- A cidade parece deserta. - Beggar disse sombrio.

- Obra do tal assassino que vive aqui?

- Slayer não é um mero assassino. - Desespero cortou o diálogo com sua voz grave e cruel. - Ele representa o próprio medo e mais ainda.

- A besta tem razão Gordon. O mal que habita esse esqueleto de metal e concreto é absolutamente vil. - O monge-mendigo fez uma pausa dramática. - É uma pena, mas acho que você deve enfrentar esse desafio sozinho.

- Sozinho? - Era Desespero quem parecia mais surpreso.

- Sabedoria não chega a ser útil contra o puro medo e eu temo que sua influência vá aumentar o poder de Slayer urso.

- Sagaz. - Riu Gordon. - Levo as fadinhas comigo, inspiração pode ser útil. Deem a volta e me encontrem na saída da cidade, eu vou o mais rápido que puder.

Separaram-se, o urso e o monge por um lado e Gordon, rodeado pela mística nuvem azul de fadinhas alegres, entrou pela rua Londres adentro.

O vento corria por entre os prédios rápido e deixava tudo gelado e duro. Gordon juntou os braços contra o peito e soprou uma baforada quente contra as mãos. O enxame pareceu ficar ligeiramente mais lento, mas as fadinhas ainda riam alto e davam gritinhos animados a cada esquina.

O jovem andou pelas ruas da cidade que jamais conhecera realmente, todos os pontos turísticos pareciam suspeitamente próximos uns dos outros, o Big Ben, o Palácio de Buckingham e aquela roda-gigante imensa que ele nunca realmente se importou de saber o nome. Logo ele encontrou algo que chamou sua atenção, a placa na rua indicava que ele estava na Rua Mothway. Seguiu por essa nova via até a esquina com a 6ª rua, viu um Pub classicamente bretão.

- Achei que esse bar ficasse na América. - Disse pras fadinhas. Elas riram alto e dardejaram ao redor da porta semi-aberta. Gordon entrou com cautela e viu alguém sentado ao balcão.

Era um homem pequeno, mirrado, sua aparência era fraca e débil, tinha a cabeça calva, mas de cabelos ainda castanhos, seus olhos eram negros e ordinários, mas cheios de um ódio e revolta como Gordon jamais vira em quaisquer par de olhos que não os seus próprios. Ele estava debruçado sobre o balcão e segurava uma longa faca de aço na mão direita.

- Olá Convicto. - Disse com uma vozinha fraca.

- Slayer. - Gordon cumprimentou de volta. - Imagino que saiba de tudo. O fim, a loucura e tudo o mais.

- Ouvi dizer, mas não quis verificar. Tive medo que fosse verdade.

- É verdade. - As fadinhas explodiram em gargalhadas agudas.

Slayer estremeceu.

- A serpente emplumada surge no horizonte, sou apenas um servo.

- O que você disse? Que serpente? Do que está falando?

- Do que você tem medo Convicto? Do que você tem medo Gordon? Ou seria Everton?

Gordon fechou a cara imediatamente.

Slayer riu baixinho, mas logo parou.

- Eu sei do que você tem medo jovem.

- Vá direto ao ponto! - Gordon ergueu a voz, Slayer se encolheu contra o balcão, depois virou pra encarar o rapaz pela primeira vez, a faca em sua mão gotejava sangue fresco.

- Sua jornada rumo ao encontro iminente consigo mesmo não é motivada pelo medo de enlouquecer Gordon. - Slayer pela primeira vez tinha uma voz firme e parecia não tremer ou sentir medo de nada. Estava consciente, sóbrio. - O que você mais teme é que tudo o que você está enfrantando seja por nada. Seu medo é que a culpa de tudo isso seja sua, só uma carência boba que você precisa suprir, não importando bem como. Custe o que custar, doa em quem doer. Seu medo é se dar conta de que você vai pisar em qualquer um em seu caminho pra conseguir o que você pensa que quer.

O jovem ficou em silêncio e sentindo sua seriedade as fadinhas pousaram em seus ombros e coçaram os queixinhos carrancudas. Gordon pesou aquelas palavras e sentiu o gosto amargo daquela sabedoria profana. Respirou fundo.

- Meu medo tem algum fundamento?

- O medo sempre tem fundamento, mas nem sempre ele é real. As pessoas temem animais que não podem feri-las pela mera lembrança das doenças que eles podem transmitir. Você teme a solidão, mas acima de tudo, você teme o que está disposto a fazer pra não se sentir só. O Cavaleiro lhe deixou uma herança cruel.

- O que eu faço pra não sentir medo?

Slayer gargalhou alto assustando Gordon e as fadinhas, elas gritaram e saíram voando pelas janelas deixando-os a sós.

- Não se pode simplesmente "não sentir medo". O medo faz parte de você, ele te impõe limites. O melhor que você pode fazer é aprender com o seu medo e tentar doma-lo. Resista aos seus impulsos infantis, lute contra aquela vontade de dizer tudo o que pensa! Coragem te dá asas pra ser um herói, o Medo te dá a disciplina pra isso!

Um silêncio pesado tomou conta do Pub, os dois apenas se encaravam, então Slayer desviou os olhos e seu transe terminou, virou-se e voltou a gaguejar e tremer.

- Agora vá Convicto, você ainda tem um longo caminho. - Disse com a voz fraca.

- Quem é o próximo?

- Vá até o porto, lá um barco os espera. As fadas já foram buscar Beggar e Desespero. Navegue pro Norte, ele vai achar você.

- Ele quem?

- Seu pior inimigo.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte IV: Everton, pois seu pior inimigo é sempre você.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Satanás montado numa Gaita de Foles

Ele caminhou confuso pelo corredor escuro, seguia aquele barulho macabro, metade música, metade animal no matadouro. Não tinha a menor idéia do que fosse. Os corredores eram estreitos e tinham farpas afiadas de metal nas paredes, parecia um labirinto cruel e infinito. Até que ele achou a fonte da barulheira.

Num salão oval, iluminado por archotes, estava um homem gordo vestindo um colant vermelho ridiculamente agarrado às suas carnes moles.Na cabeça usava uma tiara com dois pequenos chifres vermelhos, de sua fantasia saia uma cauda flácida de tecido. Estava sentado sobre uma massa disforme de panos grossos e hastes de madeira.

- Quem é você? - Perguntou o rapaz.

- Mas ora, quem? Eu sou Satanás cavalgando uma gaita de foles!

Silêncio.

- Onde eu estou?

- Nos labirintos tortuosos de sua própria desesperança. Também chamam de Loucura esse lugar. Fácil de entrar, difícil de sair.

- Quer dizer que enlouqueci?

- Sim e não. - O diabo gordo riu. - Se você veio até aqui, Loucura é um lugar que você conhece, ou seja, você pode estar se mudando pra cá sem volta, mas duvido que você já tenha enlouquecido. Afinal, estamos conversando civilizadamente não estamos?

Satanás acendeu um cachimbo e dele começou a sair fumaça azul-celeste.

- Você não é o demônio de verdade. - Disse o jovem desconfiado.

- Talvez não, mas sou algo pior, sou o demônio que mora na sua cabeça.

Ao longe ouviram um grito de homem, terrível e desesperado.

- Está pra começar. - Disse o gordo.

- Onde eu assino? - Perguntou o jovem com olhar divertido.

Os dois gargalharam e pelo labirinto centenas de criaturas rastejaram ao mesmo tempo, sombrias, cruéis e misteriosas.


Gordon "Troll" Banks

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Criação

[ Esse "episódio" foi tirado de um sonho que eu tive umas semanas atrás]

Ele acordou com uma dor intensa no topo da cabeça, pior do que qualquer ressaca que tivera na vida. A boca tinha um gosto estranho e logo ele se deu conta de que não fazia a menor idéia de onde estava. Olhou ao redor, era um lugar escuro, não parecia ter nada ali, era como estar no espaço.

Chamou por alguém, não houve resposta. Chamou de novo, silêncio.

Aí ele viu uma luz distante, estava se aproximando e ficando maior, era na verdade algo que emanava uma forte luz branca. Quando ele focou a visão e entendeu o que era, não acreditou no que seus olhos viam. Uma gigantesca baleia branca que brilhava muito, tinha marcas por todo o corpo, como tatuagens verdes e azuis e vermelhas e no alto das costas tinha duas imensas asas emplumadas e multicoloridas com todas as cores imagináveis. A baleia o fitou e pareceu sorrir, disse:

- Olá, eu sou Deus.

- Ahm?

- Eu sou Deus, prazer em conhece-lo.

Ele não disse nada, ficou fitando a baleia. Deu-se conta de que ela estava muito longe dele ainda e que mesmo assim era imensa, enorme mesmo, devia ser muito maior do que trilhares de sóis, sua voz era grave e calma, confortante. Ele duvidou dos seus sentidos, mas sabia no fundo que a entidade dizia a verdade. Chorou.

- Por que chora?

- Tenho medo.

- De quê?

- De sua grandeza!

- Nem sou tão grande assim, se fosse tão grande nem teria forma. Mas sou baleia, limitado a ser branco e ter asas, sou uma coisa, uma coisa colossal, mas apenas uma coisa.

- Eu morri?

- Não se lembra não é? Você enfiou uma arma na boca e puxou o gatilho.

O jovem identificou finalmente o gosto estranho na boca como sendo pólvora.

- Vou pro inferno?

- Não existe inferno, fique tranquilo.

- O que acontece agora?

- O próximo passo oras. - A baleia novamente pareceu sorrir. - Vou te ensinar tudo que precisa saber.

- Sobre o que?

- Sobre ser Deus.

- O quê?

- A vida é só um treino, uma preparação pra algo maior. Aí depois vem esse passo e depois o próximo e assim toda a caminhada.

- Existe algo além de ser Deus?

- Você está curioso, eu entendo. Vou te explicar tudo com o tempo, fique tranquilo.

O rapaz ficou mudo fitando a criatura, estava aterrorizado, não entendia nada.

- Qual o sentido da vida Deus?

- Criação.

O jovem chorou novamente.


Gordon "Troll" Banks

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Lepidópteras Gástricas

Fato desconhecido e que eu sempre tentei manter em sigilo é que eu gosto muito de...borboletas. É, borboletas, ha ha ha, muito engraçadas todas essas brincadeiras originais que vocês estão fazendo sobre minha sexualidade. Seguindo em frente, estava eu outro dia pensando nas lepidopteras, quando me ocorreu que elas tem muito em comum com as mulheres.

Eu explico, vamos lá.

Começando pelo básico, ambas são lindas e existem numa maravilhosa variedade quase infinita, o que te mantém sempre interessado, ocupado e surpreso no quesito aparência. Cada borboleta tem beleza rara e única assim como cada representante do sexo feminino em nosso mundo.

Item dois, delicadeza. Você já conseguiu conquistar uma borboleta? Digo, você só estendeu a mão e ela pousou em você sem rodeios? Se você já fez isso, seja bem vindo a um grupo seleto (somos poucos) de pessoas que sabem encantar borboletas. Elas são ariscas e é realmente difícil conseguir atrair a atenção de uma borboleta, caso você seja bruto e tente captura-la na marra, você terá um montinho de pernas e asas destroçadas nas mãos, as lepidópteras são muito delicadas. O mesmo vale pras mulheres! Um bom começo pode ser manter-se clássico, tanto mulheres quanto borboletas adoram flores.

Mistério e Confusão ficam sendo o item três. Voando loucamente em todas as direções, sem padrão de voo perceptível nenhum, indo pra algum lugar que apenas elas sabem qual é. Assim são as borboletas e assim, diria eu infelizmente, são também as mulheres. Não tente jamais adivinhar em qual direção ela vai desviar, não tente jamais descobrir seu destino, você só vai se frustrar amigo. "A Dança Louca das Borboletas" como disse Zé Ramalho, é só pra elas mesmas dançarem e nós espectadores observarmos de uma distância segura.

As comparações mais pertinentes ficam sendo essas. Ambas, mulheres e borboletas, exercem um fascínio sobrenatural sobre esse que vos fala. Embora eu seja ligeiramente inclinado a gostar mais das borboletas, dói menos.

Mas essas mulheres, com sua beleza misteriosa, seus pensamentos confusos, seus trejeitos delicados, elas ainda são as campeãs em minha mente e meu coração, afinal, existe um limite para o que você pode compartilhar com uma borboleta.

Gordon "Troll" Banks

domingo, 24 de janeiro de 2010

Sobre Baleias, Papagaios e Lagostas.

O homem é cheio de medos. Alguns bobos, outros sérios. Alguns leves, outros profundos. Mas acho que o maior de todos os medos do homem é a Solidão.

so.li.dão
sf (lat solitudine) 1 Condição, estado de quem está desacompanhado ou. 2 Lugar ermo, retiro. 3 Apartamento, isolamento. 4 Caráter dos lugares ermos, solitários.

O homem é um animal social e nós precisamos de contato social por isso. Claro que existem as excessões, psicopatas, sociopatas e gente que simplesmente não precisa de TANTO contato social assim, os famosos anti-sociais. Mas no geral, todo mundo precisa de um mínimo de companhia pra se sentir bem. Falando assim parece simples.

O problema é, não basta apenas se cercar de pessoas aleatórias e sem importância, você precisa de companhias siginificantes, pessoas que te façam sentir bem.

Continua um pouco simples, concordo, afinal todo mundo tem um número mínimo de amigos. E mesmo quem não tem amigo nenhum, tem que conviver com o pessoal do trabalho, aquela vizinha velha que te pede pra matar barata e o dono do buteco onde você enche a cara por ser solitário.

Então ta, qual o raio do problema com a solidão?

Acho que o pior tipo de solidão, o que atinge um maior número de pessoas pelo menos, é a solidão sentimental, amorosa. Bons macacos que somos, somos sociais, mas acima disso, somos animais e queremos perpetuar nossa espécie. Podia ser simples assim, eu ia gostar, mas não é simples, existe todo uma complexa rede de sentimentos e vontades inerentes aos humanos envolvidos.

As baleias escolhem um único parceiro e com ele passam toda a vida, os papagaios também. Caso o parceiro morra, o animal permanece solitário e fiel ao seu falecido conjuge até a própria morte. Bonito isso né? E se os humanos fossem assim? Eu sei bem que eu já estraguei tantas chances de ter alguém especial na minha vida, que eu estaria fadado a viver umas dez vidas sozinho se fosse uma baleia.

A solidão tem essa coisa de te fazer pensar que vai morrer. E quando você não acha que vai morrer, a solidão faz você desejar que estivesse morto. Bruxa maldita essa solidão, jogando com nossas vidas desse jeito, como se não tivesse importância nenhuma.

Você acorda e pensa na vida, que tem que se vestir, que tem que escovar os dentes, que tem que pegar o ônibus, que vai fazer isso pelo resto da vida sozinho, aí rola aquela sensação de facada nas costelas, uma faca gelada e dura e triste. Seu estômago dói, seu coração reclama, você fecha os olhos e respira fundo e finge que se controlou, finge que passou tudo, mas não passou, nunca passa.

Então, voltando, acho que o problema da solidão é esse. Você tem várias chances, mas na verdade só tem uma chance, porque se você estraga uma chance, aquela pessoa não vai passar o resto da vida com você e até achar a pessoa que vai ser sua lagosta (as lagostas também só tem um parceiro a vida toda), você vai sempre estar nesse constante estado de "estarnamerdismo". Afinal de contas, não é qualquer velha com medo de barata, qualquer dono de buteco que vai ser seu parceiro pro resto da vida, tem que ser uma pessoa especial, porque mesmo tendo vários amigos, só temos um parceiro, então temos que escolher bem. Complexo, complexo demais.

Agora, a escolha é todo um problema à parte da solidão, fulano gosta de fulana que gosta de ciclano que gosta de beltrana e por aí vai, já dizia o poeta. Talvez eu trate disso num próximo post, material pra usar eu tenho.

Concluindo, a solidão é uma merda. Ela te fode, te faz sentir um merda, te faz vulnerável, te faz confuso, insensível, sensível demais e muitas outras coisas, os efeitos podem variar e geralmente variam mesmo. Solução pra solidão: Pede pra nascer baleia, papagaio ou lagosta na próxima vez.

Gordon "Whale" Banks

domingo, 10 de janeiro de 2010

Semi-Vida (O Show tem que continuar)

Acordei as 2:50 da manhã. Outro pesadelo. Levantei e fui pra cozinha, abri a geladeira, tinha leite e cerveja. Bebi uma cerveja. Fui até o banheiro, ainda de cuecas, dei uma boa olhada no cara do espelho. Estava acabado, vazio, miserável.

Voltei pra cozinha, ainda no escuro, abri a gaveta de talheres. Peguei uma faca de carne imensa. Fiquei observando o brilho tímido do metal no escuro. As facas devia ser forjadas uma a uma antigamente, eram obras de arte, hoje em dia são feitas às centenas em fábricas, pedaços de merda.

Peguei a faca e senti o fio com meu dedo. Estava afiada e o aço era gelado. Encostei-a no meu pulso. Fiquei imaginando se teria coragem, mas não tinha. Se fizesse desse jeito provavelmente eu ia pedir ajuda em algum momento antes do fim, ia ficar com medo. Tinha que ser mais rápido.

Encostei a ponta da faca no pescoço, abaixo da orelha, forcei um pouco e a pele cedeu de leve, mas não machucou. Fiquei pensando em qual seria a sensação de ter aquele pedaço de ferro gelado atravessando minha cabeça e fiquei tentado com a paz que viria depois. Aí forcei a faca um pouco mais, até começar a machucar. Comecei a pensar na vida, no porque daquilo.

Pensei na minha família, nos meus amigos, na minha mãe limpando o sangue no chão da cozinha. E o cachorro? Quem ia cuidar do cachorro? Só eu cuido do cachorro, ele ia ficar na mão sem mim. Aí pensei no meu velório e no meu enterro e pensei em quem ia aparecer. Eu sei quem ia, eu sei quem não ia, mas nem faria diferença na verdade. Comecei a chorar, guardei a faca de volta na gaveta. O pescoço ficou vermelho, mas não sangrou. Nem sei se eu sangro.

Deitei na cama pra voltar a dormir, tinha que acordar às 5 pra ir trabalhar.

sábado, 2 de janeiro de 2010

2009, o ano do Martírio.

E eu lá no começo do ano pensando que esse ano seria mais fácil que o anterior. Ingênuo. Se pelo menos eu estivesse preparado pro que estaria por vir. 2009 foi um ano sofrido, pelo que eu me lembro, foi o ano mais sofrido de todos.

Pra começar, basicamente foi um ano todo da minha vida no qual eu não fiz absolutamente nada. Não que eu reclame especificamente disso, de maneira alguma, mas é um fato que eu não cresci nenhum pouco no sentido profissional e nem no sentido de ser independente. Fiquei estagnado exatamente no ponto onde estava em Dezembro de 2008 e nele fiquei até dezembro de 2009.

Socialmente foi um ano ótimo, fortaleci laços e criei outros laços novos que prometem se fortalecer nos dias que virão.

Emocionalmente foi um pouco mais complicado. No começo do ano eu tinha certas crenças, fui levado a acreditar que tudo daria certo, aí depois a porra toda desmoronou e eu por ser tão crente nas pessoas acabei bem machucado.

Foi um ano de reflexão acima de tudo, porque o que não me faltou esse ano foi TEMPO pra pensar na vida, pensar nas coisas, pensar nas pessoas. Muitos acham que isso foi minha perdição. "Cabeça vazia é a oficina do Diabo", diziam. Eu já acho que foi exatamente ao contrário, poder pensar o tempo todo foi o que me salvou.

Eu não estava preparado pro que aconteceu esse ano, pra nada do que aconteceu em sentido algum. A covardia, o rancor, a fofoca, a pena, a surpresa. Mas é tudo passado agora. Eu me reergui ainda mais poderoso que antes dos escombros das minhas ilusões despedaçadas de como as pessoas são e de como a vida segue seu curso.

2010 promete ser um bom ano, tudo aponta nessa direção e eu tenho aquele pressentimento engraçado no estômago. Mas acho que não é hora de fazer previsões, eu vou continuar seguindo, sóbrio e bêbado, pelos becos da vida.

Ainda afirmo que as pessoas que só percebem o lado ruim da situação estão perdendo o fio da meada, afinal o sofrimento é o que nos fortalece, e se o ano que passou foi o pior que eu já tive, o próximo tem tudo pra ser o melhor. Cada ação tem uma reação, certo?

Eu me sinto pronto pra perder o medo, pra tomar grandes decisões, pra mudar minha vida, melhor ainda, pra mudar as vidas das pessoas à minha volta. E no ano que vem, quando eu for escrever um post sobre 2010, eu não tenho bem certeza do que vou escrever, mas sei que seja o que for, eu não vou estar arrependido e choramingando, acabou o Martírio, acabou o flagelo. Tem um Troll aqui pronto pra botar pra foder.

Feliz Ano Novo.

Gordon "Troll" Banks
 
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