sábado, 13 de março de 2010

O Inferno de Gordon, parte IX: Heavy Metal.

Chovia bastante, mas debaixo das telhas da plataforma na estação de trem, Gordon e Desepero, estavam relativamente protegidos. Já o Troll, estava sentado nos trilhos olhando pros lados distraidamente, ja completamente molhado, mas incapaz de entrar debaixo da cobertura devido o seu tamanho.

Ouviram de longe a corneta anunciando que o trem se aproximava da estação, Troll se levantou e se afastou dos trilhos indo pro outro lado da estação. Gordon e o urso se aproximaram da faixa amarela, uma voz nos megafones da estação disse claramente:

- Não ultrapasse essa porra dessa faixa amarela cacete! Quer morrer por acaso idiota? Quer ficar maneta? É isso? Quer cair na porcaria do trilho e o ser atropelado e virar um maneta de merda? Você é algum tipo de idiota que não gosta dos seus membros? Aí fica de macaquice na plataforma tentando ser multilado por trens?

A voz continuou reclamando e xingando enquanto o trem chegava e diminuia a velocidade aos poucos ao lado da plataforma, isolando o gigante do outro lado. As portas se abriram e Gordon entrou, o vagão estava vazio. Desespero entrou em seguida e se alojou no chão do lado oposto do vagão.

- Venha Troll! - Gordon gritou pela janela.

- Vou correr ao lado do trem, não se preocupe! - Sorriu. - Preciso de exercício!

O rapaz ficou preocupado, afinal o tempo se passava de forma diferente no vortex como ele sempre percebia. Mas lembrou-se também da primeira vez em que encontrou o Troll e ele já passava dos novecentos milhões de flexões. Talvez o gigante realmente fosse apreciar o exercício.

Um sinal sonoro avisou que as portas iam se fechar. O trem lentamente começou a se movimentar sobre os trilhos. Estavam num vagão comum de passageiros, o trem era urbano e as únicas janelas estavam dos lados dos vagões onde se via a paisagem, mas não se via pra onde estava indo.

O trem seguia chacoalhando de leve deixando Gordon calmo e sonolento. Do outro lado, Desespero cochilava respirando alto, as garras arranhando o assoalho emborrachado. A velocidade gradualmente aumentou e logo o trem ia bem rápido com o Troll correndo ao lado, cada passo seu retumbando poderosos como trovões.

Gordon começou a cochilar e tinha lampejos de sonhos. Via garotas, lugares, todos muito familiares. Viu uma linha de metrô. Quando despertou se deu conta de que estava na mesma linha de metrô do sonho, mas aquilo não era agradável, o metrô corria muito e os lugares pra onde estavam indo lhe traziam más lembranças. As luzes do vagão piscavam e Desespero dormia tranquilamente enquanto o vagão ganhava mais e mais velocidade, o gigante já não corria ao lado do trem.

As luzes de repente se apagaram e Gordon teve a certeza de que algo estava errado, o destino que ele queria evitar se aproximava e do outro lado do vagão o urso se levantou com seus olhos negros cheios de maldade.

- Chegou a hora Banks. Só você e eu. Vou devora-lo seu homenzinho patético! - O urso disparou na direção do jovem e atacou com as patas potentes de garras de navalha. Gordon se abaixou e os bancos foram atingidos e destroçados pelo monstro.

- Desespero, pare! - Gordon ordenou, mas o urso riu e ignorou a ordem, novamente atacou e fez o jovem dar um pulo desajeitado pro lado. A pata imensa atingiu o fundo do vagão e estraçalhou a madeira fina deixando um buraco na frente do trem. Gordon olhou de relance e percebeu que aquele único vagão estava sobre os trilhos naquela velocidade sem nenhum maquinista.

Gordon correu pelo lado de urso, que golpeou as janelas e fez chover vidro. Conseguiu chegar do outro lado do vagão o rapaz e olhou pela janela, nem sinal do Troll. Desespero engordou 100kg e atacou novamente, quase nem cabendo mais dentro do vagão apertado de teto baixo. Sua garra destruiu o fundo do vagão e Banks desviou bem a tempo de passar correndo pelo lado da besta novamente.

O trem pareceu diminuir de velocidade, o destino cruel se aproximava, Gordon não queria chegar lá, onde quer que fosse, tanto quanto não queria ser devorado pelo urso imenso.

- Desespero, pare! Te ordeno que pare!

A velocidade diminuiu ainda mais, estavam parando.

- Fique onde está!

O trem finalmente parou.

O urso olhou para Banks com crueldade e avançou, mas jamais alcançou seu alvo.

Um braço imenso, roliço e metálico estourou a lateral do vagão e agarrou o urso pela garganta. A besta foi puxada pra fora pelo buraco, se cortando e se machucando no processo. Gordon olhou pra fora por uma das janelas destruídas pra saber o que acontecia.

Um imenso construto de metal, com mais de 5 metros de altura e aparentando ser uma armadura medieval lutava contra Desespero. Gordon deixou um sorriso invadir seu rosto e disse aliviado enquanto assistia ao combate:

- Golem!

O Golem socava Desespero com punhos duros e impiedosos, o urso grunhia de dor a cada golpe do adversário, que era ainda maior que ele mesmo. Tufos de pelo marrom voavam no ar misturados com sangue. O urso tentou reagir e cravou as presas no ombro da armadura, mas foi ignorado, o Golem não sentia dor. Agarrou Desespero e o atirou no ar, durantes segundos pode-se ver aquele urso imenso rodopiando sem gravidade, quando voltou na direção do chão, foi atingido com mais um poderoso soco que o atirou contra uma coluna de concreto daquela paisagem estranha. O urso desmaiou com o impacto. O Golem virou seu elmo para Gordon, a pequena fresta para os olhos estava vazia, era apenas uma armadura. O titã de metal então agarrou a cabeça do adversário derrotado e antes que o jovem Banks pudesse fazer qualquer protesto, arrancou a cabeça do urso sem esforço, espalhando sangue e pelos pelo chão.

Gordon saiu do trem e caminhou até o Golem:

- Estava imaginando quando você ia aparecer.

Não obteve resposta, o Golem não falava. Gordon olhou então em volta, queria saber onde estava. Era uma velha estação de metrô, mas estava abandonada, concreto e mato por toda parte, as escadas rolantes congeladas no tempo, lotações estacionadas para sempre. Viu uma placa que indicava uma estação da linha vermelha do metrô, mas a placa estava gasta demais pra saber exatamente que lugar era aquele. O rapaz estremeu por dentro, sabia onde estava, só que não queria dizer em voz alta.

- Vamos embora daqui Golem. - Saiu andando na direção pela qual tinha vindo e foi seguido de perto pelo colosso de ferro.

Ao longe ouviram som de trovões. Foram ficando mais próximos, até que finalmente surgiu o Troll correndo como um louco, suado e com ar preocupado.

- O que aconteceu? O trem disparou, não consegui correr tanto.

- Desespero tentou me devorar, mas o Golem me ajudou a tempo.

- Ah Golem, que prazer! - Troll estendeu a mão que ficou no ar sozinha por 4 longos segundos, o Golem apenas olhava pra ele sem reação.

- Ele é a inocência do Vortex Troll, não fala, não pensa, apenas age. Não fique ofendido, ele nunca comprimenta ninguém.

O Troll recolheu a mão magoado e os três se colocaram a andar novamente na direção de onde tinham vindo, deixando a macabra estação de metrô para trás. Seguindo os trilhos, acharam uma bifurcação que levava na direção que deveria ter ido desde o começo.

- Agora esperamos o trem. - Gordon disse sentando-se no chão.

Em poucos minutos viram novamente um trem se aproximar, lhe faltava um vagão. Parou e abriu as portas, Gordon examinou com cuidado e subiu, deixando os gigantes do lado de fora. O trem chacoalhou e se colou na caminho correto da bifurcação. A paisagem foi mudando conforme a viagem prosseguia, cada vez mais prédios e torres de metal, shoppings e hoteis, fábricas, muitas fábricas, logo era claustrofóbico a quantidade de ferro ao redor, era uma cidade imensa, uma metrópole que pulsava como o coração de uma entidade gigante e mecânica, Gordon soube que estava onde precisava estar, sua cidade natal, Santo André.

O trem foi parando finalmente na estação de Santo André e as portas se abriram. O rapaz desceu e olhou o trem partir, viu de longe que um trem de carga se aproximava e viu num dos vagões abertos o Golem e o Troll sentados. Saltaram na estação junto com o jovem e saíram pras ruas caóticas da cidade onde tudo era metálico e brilhava com neons chamativos e, às vezes, sem nexo algum.

- Pra onde estamos indo afinal? - Perguntou o Troll, absolutamente deslocado na cidade, vestindo apenas seu short de treino e com os músculos inchados à mostra.

- Não sei bem, mas imagino que tenha algo a ver com o Golem. - Respondeu Gordon.

O Golem não disse nada e continuou caminhando um pequeno passo a frente dos dois, o que deu a Gordon a segurança de que realmente deviam segui-lo.

Caminharam por toda a cidade, pararam pra comer em todos os restaurantes, viram espetáculos no teatro municipal, visitaram bordéis, dormiram em hotéis, beberam nos bares e se divertiram como nunca. O tempo, que era favorável no Vortex, não passou e gastaram apenas uma noite pra fazer tudo que levariam meses pra fazer no mundo real. Gordon não pode deixar de sentir que aquela era a última refeição de um condenado à morte. Ainda tinha uma missão e uma jornada a cumprir.

Seguiram o Golem então até uma torre negra de metal que sempre viam distante, mas nunca se aproximava não importando em qual lugar da cidade estivessem. Pelas ruas e meios certos, ela passou a ficar mais e mais próxima deles, até que estavam aos pés daquele monumento ridiculamente grande, um prédio. Subiram vários andares e lá dentro o Golem e o Troll não tinham problemas pra passar pelas portas e escadas, tudo era proporcional ao tamanho descomunal dos dois, que faziam Gordon se sentir uma criança o tempo todo.

Chegaram ao último andar e o jovem teve uma sensação de De Javu, aquele laboratório eta familiar, computadores pra todos os lados e no fundo algo enorme coberto com um lençol ainda maior.

- O que é aquilo? - Perguntou o Troll.

- Não sei, mas vamos descobrir. - Gordon foi na direção da coisa e puxou o lençou que saiu dramaticamente de cima daqueli que escondia.

Era uma nave. Parecia um foguete antigo, mas no meio existia um sulco num formato peculiar...no formato do Golem.

- Nós vamos voar nisso Golem? - Gordon perguntou e foi devidamente ignorado pela armadura como sempre.

O Golem começou a escalar a nave e se colou em seu lugar, encaixado no sulco. A nave pareceu ligar e os motores fizeram barulho e soltaram um pouco de fumaça. Na lateral, uma porta grande o bastante para o Troll se abriu.

É isso. Vamos. - Gordon entrou na nave acompanhado pelo irmão gigante.

A nave se fechou. Uma sirene soou alto no laboratório e o teto começou a abrir. Os motores rugiram quando o Golem acelerou e fez a nave decolar finalmente. Subiram verticalmente deixando um rastro de fogo e fumaça no céu.

- Pra onde nós estamos indo Gordon? - Troll perguntou parecendo um pouco enjoado.

- Pra lua!


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte X: O Tirano da Lua.

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