sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Inferno de Gordon, parte VI: O Templo da Flor de Lótus.

Do alto da última montanha de gelo, avistaram no vale abaixo um templo imenso. Observaram estóicos o monge, o rapaz e o urso, cercados por uma nuvem azulada de fadinhas animadas com o tempo um pouco mais ameno fora da geleira.

- Sabe quem vive ali? - Gordon perguntou ao mendigo casualmente.

- Sim.

- E quem seria?

Beggar sorriu.

- Eu.

Desceram pela encosta da montanha e finalmente pisaram numa grama azul e macia, poucas árvores magras estavam entre eles e o templo. Caminharam por alguns minutos, até chegarem na entrada principal do templo, onde eram aguardados por uma figura alta de pele queimada e olhos de águia.

- Solidão! - Gordon disse com ar surpreso.

O Cavaleiro Solitário vestia vestes simples de monge, como as de Beggar. Era ainda magro e musculoso, mas seus longos cabelos haviam sido raspados e pela abertura da camisa, podia-se ver no peito dele uma ferida horrível que ainda estava aberta e infeccionada.

- Bem vindo Convicto, e vocês também Sabedoria, Desespero, Princesas da Inspiração. - Sua fala já não tinha traço algum de sua antiga arrogância, ele parecia sereno e calmo, quase sereno demais, anestesiado.

- Você disse que essa era sua casa Beggar, que significa isso? - Gordon voltou-se sério para o monge-mendigo.

- Razão ordenou que Sabedoria guiasse sempre o Amor. - Gordon estremeceu à mera lembrança de que um dia o Cavaleiro tivesse sido o Amor do Vortex, e que hoje fosse apenas Solidão. - Eu acolhi o pobre bastardo em minha morada para que ele aprendesse de mim, que se recompusesse e quem sabe um dia...

- Basta! Não quero ouvir! - Gordon interrompeu furioso.

Afastado da discussão, Desespero engordou quase 100kg, aumentaram suas presas e garras, a besta rosnou satisfeita.

- Acalme-se Convicto. - Beggar tentou.

- Não! Não há nada que eu possa aprender da Solidão! Ainda acorrentado naquele templo, ainda chamado Amor, talvez você pudesse me ensinar algo que nos ajudasse nessa hora, mas sendo quem você é agora seria uma perda de tempo parar aqui e conversar com você! - Gordon estava aos berros, o rosto vermelho, os olhos inflamados e negros.

- Gordon, por favor. - Disse o Cavaleiro.

- Não!! Já disse que não quero ouvir!! - Gordon se precipitou e enfiou um soco no rosto de Solidão, ele cambaleou para trás e caiu sentado no chão.

Desespero, com uma agilidade desproporcional ao seu corpo imenso, levantou-se e se colocou ao lado de Gordon rosnando para ele, no processo, engordou 300kg, estava enorme agora, mesmo sobre as quatro patas tinha quase dois metros e meio de altura.

- Tão cedo Convicção? Achei que você fosse durar mais fedelho! - Disse a besta.

- Gordon, acalme-se! Controle-se! Acredite que algo de bom pode sair dessa situação! - Beggar implorou.

Gordon fitou o urso com ódio, depois seu ódio foi ainda maior quando encarou Solidão, então finalmente viu Beggar e ao redor dele as fadinhas azuis que riam e brincavam alheias à situação tensa que se desenrolava. Rendeu-se e sorriu ao ve-las.

- Preciso de tempo pra me acalmar.

- O tempo que precisar Convicto. - Disse Beggar. - Afaste-se Desespero! Vamos para dentro do templo. Você também Solidão.

O rapaz caminhou pra longe da entrada do templo, os portões de madeira foram ficando menores a medida que ele subia uma colina onde soprava uma brisa gelada e inquietante. Olhou ao redor, colinas e mais colinas daquela grama azulada e fofa, um oceano de colinas azuis. Sentou-se.

Sentiu um puxão no cabelo e percebeu que tinha sido seguido pelo batalhão de fadas azuis, elas estavam se estapeando pelos melhores lugares em seus ombros. Finalmente sentaram-se todas.

- Beggar está pedindo demais de mim dessa vez. Dar ouvidos àquele traidor, àquela coisa maldita.

Uma voz tranquila veio de algum lugar atrás de Gordon:

- O destino do Vortex depende de seu aprendizado nessa jornada, você sabe disso.

- Mas o que Solidão poderia me ensinar?! É absurdo achar que ele tem qualquer informação que seja. - Gordon retrucou sem olhar para trás.

- Você reage assim porque Solidão é a criatura que você mais teme Convicto.

- Eu não o temo!

- Teme sim. E não poderia ter ficado mais claro pela maneira como você se comportou lá embaixo. Desespero está se fortalecendo da sua fraqueza.

Gordon não disse nada por um tempo, ficou brincando de cabo de guerra com as fadinhas e um pedaço de grama alta.

- Precisamos que você aprenda a tirar força das dificuldades que enfrentar Convicto. De você depende o Vortex e a existência de todos nós. Lembre-se de Ananasi e Slayer, lembre-se de Tornado e Everton, aprenda a usar as armas que eles lhe deram, selecione o que você quer fazer, analise como usar isso e então entre em ação!

- É tão difícil...e eu estou sozinho, tudo recai sobre mim...como posso saber que estou no caminho certo? Às vezes eu penso em só me sentar aqui e não fazer nada, deixar a maldita loucura tomar conta de tudo. Seria tão mais fácil.

- Você realmente acredita nisso Convicção? Porque se acreditar, estamos todos condenados. Se você realmente acredita que não fazer nada é a melhor solução, nem se dê o trabalho de levantar, porque antes que você perceba, a Serpente Emplumada vai dominar tudo o que existe de importante aqui para nós.

- O que é essa Serpente afinal? Slayer falou dela.

- Acredite que você pode fazer a coisa certa Convicto, salve o Vortex e a todos nós e aí talvez, você jamais precise saber o que é a Serpente.

- Só gostaria de ter todos os detalhes.

- ...

- Você já foi embora não é?

Gordon se virou para ver a colina vazia como estivera o tempo todo, suspirou.

- Vamos meninas. - Disse levantando-se. - Nós temos que ter uma conversa com aquele cara lá embaixo.


A SEGUIR: O Inferno de Gordon, parte VII: O Sermão da Solidão e da Sabedoria.

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