Era um daqueles dias em que o ar está parado, as pessoas andam silenciosas, como se seus passos não fizessem barulho. Era feriado.
Aquele vazio vinha me devorando há alguns meses, eu achei que havia superado o que quer que fosse, mas aparentemente ainda estava contaminado com aquela incapacidade de sentir qualquer coisa.
O tempo parecia parado, ainda assim os dias corriam como corcéis selvagens, livres e caóticos.
Eu tinha visto duas pessoas morrerem no trabalho em menos de uma semana. Aquilo tentava me dizer algo, mas eu não queria pensar em nada.
Aí vi a Doutora, jovem, alta, cabelos negros, quadris largos. Ela estava dando a notícia pra família e eu por um instante pensei que aquele devia ser o pior trabalho do mundo. Um dos familiares começou a chorar.
Eu tenho esse direito? De me sentir tão mal? Acho que não...nenhum de nós tem...cancelamos o direito uns dos outros de nos sentirmos péssimos, porque sempre existe alguém em situação mais desesperadora.
Ai me passou um monte de coisa pela cabeça, e no meio do turbilhão lembrei de uma cena engraçada.
Um menino de 14, 15 anos andava de bicicleta, perdeu o equilíbrio e levou um tombo feio no asfalto. Um negrão careca, amigo meu, estava por perto e alertou: Cuidado pra não cair hein! O garoto possesso com a brincadeira e o tombo lançou: Vai tomar no seu cú!
Era simples, bobo, cotidiano, mas eu comecei a rir, me senti feliz pela primeira vez em meses.
De repente, aquele gosto amargo já não estava mais lá.
A vida era boa.
sexta-feira, 21 de março de 2008
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